Lisiane Rotta

1984

Por Lisiane Rotta

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Escrito pelo jornalista e romancista britânico George Orwell em 1948 e publicado em 1949, um dos romances mais citados e polêmicos do século 20, traduzido em 65 países, ganhou ainda mais notoriedade quando a produtora holandesa Endemol batizou o reality show que chegou a TV nos anos 70 de Big Brother, o mais sinistro personagem do livro. John de Mol, o mentor do programa, nega a inspiração, embora seja difícil crer que tantas similaridades sejam só uma coincidência.

 
A história se passa em Londres, na fictícia Oceânia, onde o Big Brother é o líder máximo. O Grande Irmão tem 45 anos e assumiu o poder depois de uma guerra de escala global que eliminou as nações e criou três grandes estados totalitários. A Oceânia reúne a ex-Inglaterra, as ex-Américas, ex-Austrália, ex-Nova Zelândia e parte da África.

 
Cartazes espalhados pelas ruas, lugares públicos e até mesmo nos lares, com a figura da autoridade suprema com a legenda: “O Grande Irmão está de olho em você” lembram a população de que está sendo monitorada pelas teletelas, uma espécie de TV que se encarrega de espionar, gravar, devassar a intimidade de todos.

 
Winston Smith, o protagonista, funcionário do Departamento de Documentação do Ministério da Verdade, um dos quatro ministérios que governam Oceânia, tem como função falsificar registros históricos, a fim de moldar o passado à luz dos interesses do presente tirânico. A Polícia das Ideias atuava como uma patrulha do pensamento. Inúmeras regras são determinadas pelo Partido. Winston detesta o sistema, mas só se permite desafiá-lo através das páginas do seu diário. Porém, quando se apaixona por Júlia, funcionária do Departamento de Ficção, começa a acreditar na possibilidade de uma rebelião. No entanto, combater o regime não é nada fácil.

 
George Orwell é um pseudônimo, Eric Arthur Blair nasceu na Índia em 1903, cursou uma escola da elite antes de entrar para Polícia Imperial da Índia, onde conheceu a truculência do Império Britânico tentando controlar os nativos. Prestes a ser promovido, largou a farda, chocado com o que presenciara, e caiu na boemia de Paris e Londres. Chegou a morar nas ruas. Em 1936 foi para a Espanha lutar contra o Franquismo. Uma de suas mais fortes características era o apurado senso de justiça. Desencantado com as utopias políticas, atacou impiedosamente a União Soviética em A revolução dos bichos, em 1945. “A aceitação de qualquer disciplina política parece ser incompatível com a integridade literária” afirmava ele, inconformado com a subserviência dos intelectuais de esquerda ou direita.

 
1984 é impressionantemente atual. Aborda questões, como o desrespeito à liberdade de pensamento, de expressão e a privacidade numa época em que não se poderia imaginar que o avanço tecnológico permitiria um monitoramento tão amplo. Um controle inimaginável. Os métodos evoluíram e a informação, através da espionagem, continua a ser uma das chaves do sucesso dos regimes autoritários. A censura das informações, a repetição através do marketing, a doutrinação das novas gerações, o cancelamento das pessoas “individualistas”, que dão lugar às dúvidas e questionamentos, são assustadoras. As teletelas do livro de Orwell são as ferramentas de controle da época. Estão em toda a parte. “Viveremos uma era em que a liberdade de pensamento será de início um pecado mortal e mais tarde uma abstração sem sentido”, afirmou o autor profeticamente.

 
Em 1984 a língua ganha novos termos e as palavras antigas, novos significados. É a nova fala. A semântica é distorcida para criar um estado de torpor e confusão. Qualquer semelhança não é mera coincidência. O grande legado de Orwell, afirmam os críticos, é a sua lucidez política.

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